Oferta anunciada com erro precisa ser cumprida

Consumidor que teve acesso a um anúncio que tenha sido posteriormente corrigido pode exigir o cumprimento da oferta inicial, independentemente da publicação da errata.
O anúncio, estampado em meia página do jornal de domingo, parecia promissor: toda a linha de automóveis da montadora Fiat era oferecida com entrada de R$ 990 e saldo em 60 vezes fixas. Interessado na oferta, o advogado Aldo Vianna ligou para o 0800 da montadora, a fim de verificar as condições da compra. Levou um balde d’água fria: o anúncio havia sido publicado com erro, e não informava ao consumidor a taxa de juros que incidia sobre as parcelas. Dias depois, a montadora publicou uma errata – mas não cumpriu com a oferta que Vianna leu naquele jornal de domingo. “A errata virou água benta agora?”, questiona o advogado. De fato, este instrumento, diz o Código de Defesa do Consumidor, não pode ser considerado uma varinha de condão, e é obrigação do fornecedor cumprir com a primeira oferta para quem só teve acesso a esta.
“A regra é o cumprimento do anúncio”, comenta o advogado e professor de Legislação Publicitária da Unibrasil, Ney Queiroz de Azevedo. “Mesmo se a informação sair equivocada, o fornecedor é obrigado a cumpri-la.” Como embasamento, Azevedo empunha o artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor, que diz que toda publicidade integra o contrato que vier a ser celebrado – esteja ela com erros ou não.
Azevedo, que também é publicitário, diz que uma pergunta comum que recebe de seus alunos no curso de Comunicação é: “Mas e se for um erro na impressão?” A resposta sai na lata: “Revise bem, porque qualquer erro, depois, é um grande problema.”
Para ele, a obrigatoriedade da oferta prevista no Código de Defesa do Consumidor é mais um motivo para que tanto o anunciante quanto as agências de publicidade tenham consciência do peso que um anúncio carrega, e passem a lidar com ele de forma mais responsável.
O advogado, no entanto, faz uma ressalva: o cumprimento ao primeiro anúncio só é obrigatório para o consumidor que não tiver acesso à errata e que manifestar interesse pela oferta. O que vale, nesses casos, é o princípio da boa-fé – trocando em miúdos, acreditar que o outro diz a verdade. “Se o consumidor diz que não teve acesso à errata, deve-se entender que ele realmente não a viu e que tem o direito de ver cumprida a primeira oferta.” O interesse legítimo no produto ou serviço antes da publicação da errata é necessário para provar que o consumidor não tem o interesse de tirar vantagem do erro do fornecedor – o que, no jargão jurídico, é chamado de “enriquecimento ilícito”.
Para que a errata seja o mais eficiente e clara possível, o que favorece tanto o fornecedor quanto o consumidor, Azevedo recomenda que o novo anúncio tenha a mesma intensidade da publicidade original, com o mesmo tamanho e as mesmas cores. “Se o anúncio original é enorme a errata sai no pé da página, em preto e branco, o consumidor pode não ver, e isso é um problema.” O ideal também é que a errata seja publicada em curto prazo, a fim de informar o maior número possível de consumidores sobre a oferta.
O advogado Aldo Vianna, que viu a publicidade da Fiat em fevereiro de 2006, está desde então tentando garantir o cumprimento da oferta original. Ele entrou com um processo contra a montadora, mas perdeu em primeira e segunda instâncias. A ação agora está em fase de recurso – o consumidor diz que irá até o Supremo, se preciso for. “Temos de balançar as bases do mito que se criou em torno das erratas, como se elas fossem ‘pílulas douradas’ a findar as obrigações dos fornecedores arrependidos.”
Fonte: Gazeta do Povo