“Em 2022, precisamos consolidar o ritmo de recuperação da economia”, diz Marcelo Queiroz

 


“Hoje, nosso foco principal é garantir o não retrocesso do funcionamento das atividades econômicas. Especialmente, o turismo deve ter um foco especial nas ações de promoção do nosso destino e negociação junto às empresas aéreas para revisão dos valores das passagens para Natal. Avançar nestas negociações é imprescindível”. A afirmação do presidente do Sistema Fecomércio, Marcelo Queiroz. Ele destaca nessa entrevista à TRIBUNA DO NORTE que “o Estado precisa recuperar sua capacidade de crescimento, trabalhar para atrair novos investidores e, fundamentalmente, garantir a continuidade do funcionamento das atividades econômicas”. Nos últimos dois anos, os empreendedores do setor de Comércio de Bens, Serviços e Turismo, responsável por sete em cada dez empregos formais gerado, vêm acumulando perdas irreparáveis, afirma. Ele também fala sobre os 73 anos da Fecomércio e as pautas que sendo tratadas como instrumento de desenvolvimento. Confira.

A Fecomércio completa este ano 73 anos. Que balanço o senhor pode fazer?
É impossível pensar no desenvolvimento do Rio Grande do Norte nessas últimas sete décadas, sem vislumbrar a participação da Fecomércio. Desde o princípio, a Federação esteve presente, não só representando, como também defendendo os interesses do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, que inegavelmente são os setores mais importantes da economia potiguar, responsáveis por sete em cada dez empregos formais gerados. Eu acredito que essa história tem deixado também um grande legado para a sociedade, que é o crescimento da nossa rede de prestação de serviços. Afinal, essa construção também tem perpassado pela qualificação profissional dos cidadãos e assistência ao trabalhador, papéis desempenhados pelos nossos braços Senac e Sesc, respectivamente. Estar presente no desenvolvimento do Estado implica em atuar em regiões estratégicas. Tanto por meio dos nossos sindicatos filiados, como também das unidades de Sesc e Senac, conduzimos projetos que contribuem na melhoria do ambiente econômico. Olhando para os dias atuais, especialmente, nos últimos dois anos, toda a nossa expertise e estrutura se voltou para atender aos desafios da pandemia. O Sistema Fecomércio se adaptou rapidamente para atender o empresário, trabalhador do comércio e a população potiguar, criando projetos e dialogando com os poderes públicos para minimizar os efeitos da crise. Hoje, quando vemos que o pior já passou, nosso foco é continuar trabalhando para recuperar o que foi perdido.

Qual paralelo o senhor faz entre o setor de comércio e serviços há 73 anos e agora?
Em 1949, o cenário era bem diferente do atual, o Estado somava apenas 900 mil habitantes. Os negócios locais giravam em torno das vendas a granel, do comércio de mercadorias e de serviços ainda tímidos. O turismo, na forma de atividade comercial organizada ainda não existia no Estado. Hoje, os setores de Comércio e Serviços reúnem 76% dos empregos formais gerados no RN e respondem por quase 77% do PIB do Estado. São os principais pilares da nossa economia. Vivemos uma nova fase no comércio, que ganhou uma proporção gigantesca devido aos avanços tecnológicos dos últimos anos. A maneira de comunicar, de vender e consumir mudaram. Cada vez mais, o Varejo 4.0 tem combinado as tendências da internet com o mundo real para aprimorar tanto a experiência de compra, como o relacionamento com o cliente também. Por sua vez, o turismo é cada vez mais profissional, trabalhando o visitante com um foco voltado em experiências customizadas. 

No cenário da pandemia, quais os desafios para os setores de serviços e comércio este ano?
Precisamos, em 2022, consolidar o ritmo de recuperação da nossa economia. Os empreendedores do comércio e serviços vêm acumulando perdas irreparáveis nos últimos dois anos. Hoje, nosso foco principal é garantir o não retrocesso do funcionamento das atividades econômicas. Especialmente o turismo deve ter um foco especial nas ações de promoção do nosso destino e negociação junto às empresas aéreas para revisão dos valores das passagens para Natal. Avançar nestas negociações é imprescindível. Também há importantes pautas sendo discutidas no Fórum Estadual Permanente das Microempresas, das Empresas de Pequeno Porte e dos Microempreendedores Individuais. Esse segmento representa mais de 90% das empresas do nosso Estado e precisa de uma priorização em diversos pontos, sobretudo quanto às compras governamentais, que devem ser tratadas como instrumento de desenvolvimento. No cenário nacional, acompanhamos com preocupação algumas questões. O recrudescimento da inflação, a consequente perda de renda do trabalhador e a dificuldade em debelar as altas taxas de desemprego são as principais. O cenário de instabilidade fiscal e política fez disparar o dólar, que impacta diretamente nos preços dos combustíveis que têm reflexos em praticamente todos os preços da economia. Para completar, veio a escassez hídrica que, por falta de uma política longeva de reformulação de nossa matriz energética elevou as tarifas de energia a patamares insuportáveis, com reajustes de até 50% na conta de luz dos brasileiros. Tudo isso fez ressurgir a temida inflação. Perceba que é um conjunto imenso de pontos que são, ao mesmo tempo, causa e efeito um do outro e que acabam gerando um círculo vicioso terrível. Isso precisa ser interrompido. Também entendemos como imprescindível o distensionamento das relações políticas. E precisamos que as reformas andem no Congresso, pelo menos a Tributária ou, se não totalmente, a do Imposto de Renda, que já teria um impacto considerável para o consumo.

Desde o início da crise sanitária, até agosto do ano passado, quase 10 mil empresas fecharam no RN, de acordo com levantamento da própria Fecomércio. Houve recuperação, ou a crise se acentuou? Que dados atuais a Fecomércio tem que aponte o cenário ao final do ano de 2021?
Na verdade, houve uma grande mudança de perfil. Enquanto cerca de 10 mil empresas de grande porte fecharam, cerca de 34 mil MEIs surgiram, o que pode ser facilmente explicado em virtude da necessidade das pessoas de manterem alguma renda no cenário de extrema dificuldade que levou ao fechamento de empresas maiores. Sobre o cenário final de 2021 aqui no Estado, os principais indicadores se mostram animadores. Por exemplo, as vendas do comércio – que é, junto com o setor de Serviços, o grande pilar de geração de ocupação, renda e tributos do RN -, têm um crescimento acumulado de 3% até novembro, que é o último dado disponibilizado pelo IBGE. Se nós considerarmos que, em 2020, neste mesmo período, amargávamos queda de 4,9% nas vendas, é um número digno de nota. O nível de emprego formal, outro importante indicador, também é animador. Até novembro, abrimos pouco mais de 33 mil novas vagas com carteira assinada, o que já nos leva a recuperar, com uma folga de mais de 30 mil postos, os 3,1 mil empregos que perdemos em 2020. E, importante destacar, que Comércio (com saldo positivo de 7,6 mil empregos em 2021) e Serviços (com 14,6 mil) estão entre as grandes locomotivas desta geração de empregos no Estado, seguidos do agronegócio, da construção civil e da indústria de transformação.

Que desafios e gargalos o RN precisa superar para alavancar o desenvolvimento, gerar mais empregos e aumentar o poder de compra do potiguar?
É importante entender que o Rio Grande do Norte não está ilhado e a sua recuperação está relacionada ao cenário nacional. Como eu citei, vivemos um cenário de instabilidade fiscal e política. Fechamos 2021 com uma inflação de 10,67%. Isso fez com que o Banco Central elevasse sistematicamente a taxa de juros básica da economia que começou 2021 em 2% e terminou em 9,25% ao ano, com reflexos em toda a cadeia de crédito e no agravamento dos níveis de endividamento da população. Olhando especificamente na perspectiva local, o Estado precisa recuperar sua capacidade de crescimento, trabalhar para atrair novos investidores e, fundamentalmente, garantir a continuidade do funcionamento das atividades econômicas. No RN, temos 88% das famílias endividadas e 37% inadimplentes. Temos visto dobrar, em um ano, o volume de pessoas que, para fechar as contas do mês recorrem a créditos como o cheque especial e o rotativo do cartão de crédito, cujos custos já se aproximam dos 500% ao ano. É uma bola de neve que coloca a corda no pescoço do trabalhador e, naturalmente, freia o consumo. Com menos consumo, a indústria produz menos, o comércio vende menos e ambos empregam menos. Com isso não conseguimos devolver a patamares razoáveis o desemprego. Do ponto de vista da infraestrutura, temos importantes obras nas nossas rodovias que precisam avançar, bem como eu destacaria a relicitação do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, que é um equipamento fundamental para o turismo e para o desenvolvimento da economia do estado como um todo. A questão hídrica ainda é um grande gargalo para o crescimento no interior do estado e um ponto de atenção constante para os governos em todos os âmbitos. Nosso porto também precisa de medidas que o tornem mais ágil e competitivo, e é importante buscar a inclusão do RN no projeto de implantação de ferrovias do Nordeste

Como a Fecomércio pode contribuir nesse sentido?
A Fecomércio é a grande articuladora das pautas dos segmentos do comércio, serviços e turismo junto aos entes governamentais. Temos trabalhado incansavelmente para garantir um ambiente de negócios favorável para a retomada do crescimento destes setores essenciais para a nossa economia. Além disso, estamos, nos últimos dois anos, vivendo uma grande reformulação interna, que passa pela modernização dos nossos processos, lançamento de novos projetos, com foco em inteligência, inovação e competitividade. Essas ações resultam diretamente no fortalecimento e expansão do trabalho dos nossos 16 sindicatos filiados, que juntos com a Federação, representam 200 mil empresas, as quais formam a base da economia do Estado, gerando mais de 330 mil empregos formais. Além disso, seguimos firmes em ações de apoio ao Turismo, desde a qualificação, promoção e inteligência, como é o caso do Sírio – Sistema de Inteligência Turística do RN, uma parceria importante com a Emprotur premiada nacionalmente em 2021, e que vem contribuindo diretamente com um planejamento mais assertivo para esta atividade econômica tão importante para o Rio Grande do Norte. O Programa de Desenvolvimento Econômico Local (DEL) é outro destaque, que tem feito uma verdadeira revolução em vários municípios e o planejamento para 2022 é avançar ainda mais. 

O Sistema Fecomércio tem forte trabalho na qualificação profissional.  Como isso tem impactado na empregabilidade?
Atualmente, por meio do Senac, dispomos de um portfólio com cerca de 350 cursos de formação profissional, distribuídos em mais de dez áreas de atuação, entre elas as áreas de Tecnologia da Informação, Comércio, Gastronomia e Turismo. A qualificação profissional está diretamente ligada ao aumento dos índices de empregabilidade de um cidadão. Em uma pesquisa realizada em 2021, identificamos que, na hora da contratação, os empresários norte-rio-grandenses dão preferência a um candidato quando ele possui um curso de capacitação do Senac. Por isso, temos expandido nossa capacidade operacional em todo estado, inclusive com atendimento remoto, por meio de aulas online ao vivo, democratizando o acesso ao ensino profissionalizante. Outro destaque é o nosso Hotel-Escola Senac Barreira Roxa, um equipamento único no Norte e Nordeste, que coleciona diversas premiações nos últimos dois anos, e que tem compartilhado com os empreendimentos do trade sua expertise especialmente na área de Gestão Sustentável, além de formar os profissionais que atuam nesta importante cadeia produtiva. O nível de capacitação dos colaboradores de uma empresa se reflete diretamente na qualidade dos serviços prestados. Quanto mais qualificado é o time de colaboradores, maiores são as oportunidades de crescimento do negócio. 

TRIBUNA DO NORTE