À procura da identidade

Natal. Algum dia qualquer dia um mês qualquer. Mais uma casa antiga é derrubada para dar lugar a uma farmácia, a um edifício, a um terreno baldio. Mais um prédio cai na Ribeira. Num mundo onde o retrô e o vintage são valorizados, a arquitetura amarga o esquecimento. Como se os novos traços arquitetônicos das recentes tendências da arquitetura não pudessem conversar com as linhas clássicas. E quando tentam fazer... Ah, é só passar em frente ao prédio do NatalPrev, na avenida Deodoro da Fonseca, para entender o descompasso.

Na Cidade Alta, a Vila Palatnik perde sua vida. Sobrou a sinagoga, que ninguém sabe o que é. O Beco da Lama reviveu graças às cores e formas de grafites de artistas plásticos. Observe que, enquanto uma parte da cidade se torna uma verdadeira galeria a céu aberto, outra parte amarga o esquecimento. Cada dia mais vemos lindos murais pintados com incentivo público e privado. De uma ponta a outra, do Leningrado à Ribeira, galerias a céu aberto de encher os olhos. Mas onde vive a história que nos fez chegar até aqui?

Natal cresceu e deu as costas para o rio Potengi. Onde a cidade começou, foi sendo esquecida. As fachadas foram perdendo a cor, a vida, a graça. Um e outro tentam mostrar a importância crucial da Ribeira. Mas parece que alguns pensam que a vida deve ser cosmopolita e só rodar no circuito Petrópolis/Tirol/Ponta Negra.  E falando em Ponta Negra, lembremos da Vila, berço de tanta cultura e tradição de um povo que morava na outra ponta de Natal, um areal onde ninguém ia.  E que, mesmo depois da chegada de investimento estrangeiro e asfalto, ficou para lá.

Temo pelo futuro. Não só pelas casas, pela história, pela vida que existiu antes de nós. Não temo apenas pela lembrança da viúva Machado, de Rocas-Quintas, de Nemésio Morquecho, Lucy Garcia, Maria Boa... Temo pelo todo da nossa memória, ainda salvo por Cascudo que de tanto ser falado, é conhecido. Talvez não na sua totalidade, mas no cerne da importância de sua face folclórica. Que, ao menos por ele, possamos (re)viver toda a nossa história.

Valéria Araújo