Natalprev apresenta à Justiça planilhas que comprovam “rombo” de quase R$ 80 milhões


Apesar das inúmeras negativas do prefeito Carlos Eduardo Alves (PDT) e da bancada governista na Câmara Municipal de que há um déficit na previdência própria do Município, a gestão do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de Natal (Natalprev) reconheceu oficialmente a existência de um débito milionário nos cofres da instituição.
A confissão foi feita por meio da apresentação de documentos à Justiça que detalham as movimentações feitas no fundo nos anos de 2015 e 2016 e nos dois primeiros meses de 2017. Os registros foram juntados aos autos de um processo movido pela vereadora Natália Bonavides (PT), após não ter requerimentos atendidos pelo órgão. A petista deu entrada na representação para solicitar informações detalhadas a fim de complementar a análise de possíveis irregularidades no regime de previdência municipal dos servidores.
Nas planilhas entregues à Justiça, em atendimento à determinação da juíza Patrícia Gondim Moreira Pereira, da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal, o Natalprev mostra que os três últimos repasses de 2015 (novembro, dezembro e 13° salário), além dos treze repasses de 2016 e dos dois primeiros (janeiro e fevereiro) de 2017, não foram totalmente efetuados, no período devido, pela Prefeitura de Natal. Ou seja, a administração municipal recolheu a contribuição previdenciária dos servidores, mas não fez a transferência para os fundos do Natalprev como deveria. A própria contribuição patronal também não foi depositada corretamente no período citado.
O somatório dos débitos apontados na planilha do Natalprev, tanto da contribuição patronal quanto da dos servidores do município, chega a R$ 78,2 milhões. O valor é próximo da quantia apurada inicialmente pela vereadora Natália Bonavides (de R$ 80 milhões), denunciante do “rombo” nos cofres do Instituto. As planilhas do Natalprev comprovam os indícios da falta de recursos.
No que diz respeito ao repasse da contribuição dos servidores, o relatório do Natalprev aponta que havia um débito de R$ 23,1 milhões no período em questão, mas que já foi quitado pelo Município. Como o pagamento foi feito com atraso, a Prefeitura teve de arcar com cerca de R$ 1,3 milhão com juros e multas, já incluído no valor mencionado.
Segundo a vereadora Natália Bonavides, no entanto, o pagamento foi feito de última hora, após a abertura da ação judicial solicitando as informações, na semana passada. A conclusão foi feita a partir da análise de todas as tabelas disponibilizadas e do cálculo dos juros. A petista questiona ainda a origem dos recursos. “Como o prefeito não tinha R$ 15 milhões para completar a folha e agora tem R$ 23 milhões para pagar um débito no Natalprev?”, pergunta.
No que diz respeito ao débito das contribuições patronais, efetuadas pela própria Prefeitura, o débito ainda é existente e chega a R$ 55,1 milhões, valor já atualizado com correções. Sobre este valor devido, o conjunto de documentos apresentado pelo Natalprev traz um Termo de Acordo de Parcelamento e Confissão de Débitos Previdenciários, assinado pelo prefeito Carlos Eduardo Alves (PDT).
Neste documento, o Município admite que deixou de repassar o valor, assume a dívida e se compromete a pagar em 60 (sessenta) parcelas mensais. O valor já contempla juros e correção monetária, o que representa quase R$ 2 milhões do montante devido.
Pelo acordo firmado neste termo de confissão de débitos, o Município fará a transferência ao Natalprev de parcelas mensais de pouco mais de R$ 919 mil, tendo como garantia de pagamento as verbas recolhidas pelo Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Os documentos entregues pelo Natalprev à Justiça contém, para isso, uma autorização para o Natalprev poder fazer débitos na conta destinada ao recebimento dos repasses da União.
Para a vereadora Natália Bonavides, autora da denúncia e da representação judicial que obrigou o Natalprev a fornecer os dados, a confissão representa uma flagrante ilegalidade. Por causa disso, ela pretende dar entrada na próxima semana em representações contra o prefeito Carlos Eduardo Alves no Ministério Público e no Tribunal de Contas do Estado para que as instituições apurem possível cometimento de improbidade administrativa.
Advogados ouvidos pela reportagem do Agora Jornal apontam que o débito, acumulado de mais de um ano, representam uma espécie de empréstimo efetuado pelo Município no Natalprev. A realização de qualquer empréstimo com instituições precisaria da autorização da Câmara Municipal, como o prefeito tem tentado há algumas semanas.
POLÊMICA NA PREVIDÊNCIA 
A confissão do débito na Justiça acontece em meio a uma polêmica instaurada em torno dos recursos da previdência municipal. Além da denúncia da vereadora Natália Bonavides, que constatou “fortes indícios” de déficit, agora comprovados pelo próprio Natalprev, um projeto enviado pelo Executivo à Câmara dispõe também sobre remanejamento de verbas desses recursos.
Nesta terça-feira 4, após diversos questionamentos sobre o trâmite da matéria, a Câmara vota em segunda discussão o controverso projeto de lei complementar que autoriza o Executivo a efetuar um saque de R$ 204 milhões no Natalprev. A proposta, que estimulou intensos debates no Legislativo semana passada, foi aprovada em primeira discussão na semana passada por 21 votos a 4.
Pela proposta, o município usará os recursos – a partir de saques mensais de aproximadamente R$ 15 milhões – exclusivamente para o pagamento de servidores inativos do município. A alegação para a aprovação do projeto é a queda vertiginosa da arrecadação do município.
A oposição pede que a apreciação da matéria aconteça apenas depois que o Natalprev forneça a documentação solicitada, contendo informações sobre as movimentações no fundo (o que já foi feito na Justiça), e de uma audiência pública marcada para a próxima quinta-feira 6 para debater o tema. A expectativa é que a presidente interina do Natalprev, Adamires França, compareça à Câmara para prestar esclarecimentos aos vereadores sobre as possíveis irregularidades no fundo.
Em contato com a reportagem, a vereadora Natália Bonavides afirmou também que vai questionar a gestão do Natalprev e a administração municipal sobre a utilização dos recursos que não foram repassados ao Natalprev por mais de um ano, haja vista que o recolhimento da contribuição dos servidores foi feito.
A própria tramitação do projeto de lei complementar é alvo de ações na Justiça, o que pode anular as decisões do Legislativo em decisões judiciais futuras.
O prefeito Carlos Eduardo Alves, autor da proposta de empréstimo dos recursos do fundo, negou veementemente durante a última semana a existência de débitos na previdência. Pelas redes sociais, o chefe do Executivo até emitiu declaração polêmica, ao negar “rombo” no Natalprev e dizer que quem provocou o “verdadeiro rombo” no país foram as administração dos governos do PT na esfera nacional. O PT é o partido de dois vereadores da oposição ao prefeito na Câmara, Natália Bonavides e Fernando Lucena.
“Não existe rombo na Previdência da Prefeitura de Natal. Vivemos apenas as consequências do que está escrito aí embaixo”, afirmou o prefeito, mostrando a reprodução de uma nota de jornal que mostra índices econômicos do Brasil. “PT, na oposição, voltou com suas catilinárias. Telhadão oceânico de vidro, veja abaixo o verdadeiro ‘rombo’ no Brasil”, complementou o pedetista.
Procurada pela nossa reportagem, a presidente do Natalprev, Adamires França, não retornou aos contatos.
Já o líder do Governo na Câmara, Ney Lopes Júnior (PSD), afirmou que a apresentação dos relatórios não deve interferir na votação da proposta na tarde de hoje. Segundo ele, todos os débitos existentes já foram parcelados, “o que não é nenhuma ilegalidade”. Perguntado sobre a ocorrência de um eventual empréstimo com o Natalprev, o líder do Governo negou que isso tenha acontecido e concluiu afirmando que atrasos em pagamentos são normais e não configuram “ilegalidades”.

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