Internações por queimaduras com álcool 70% sobem no país


A Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ) acompanha diariamente, desde março, os casos de internações com queimaduras devido ao álcool 70%, em 36 Centros de Tratamento de Queimados (CTQs) e hospitais gerais pelo país. O monitoramento gerará um estudo científico do impacto do álcool durante a pandemia no Brasil.

Desde o dia 19 de março até o dia 12 de agosto, já foram contabilizadas 497 internações por queimaduras com álcool 70%, na forma líquida ou em gel. Delas, 141 foram em São Paulo, 107 em Goiás, 63 em Pernambuco, 34 em Mato Grosso, 20 em Minas Gerais, 17 internações na Bahia e no Espírito Santo, 16 em Brasília, 12 no Paraná e em Sergipe, 11 no Rio de Janeiro, oito no Mato Grosso do Sul, sete em Teresina e no Rio Grande do Norte, seis no Pará e na Paraíba, cinco em Porto Velho e no Rio Grande do Sul e três em Santa Catarina.

Com a Sociedade Brasileira de Queimaduras, o cirurgião pediátrico Maurício Pereima coleta os dados dos pacientes enviados pelos CTQs do país, até o final do ano o estudo deve estar pronto. De acordo com o especialista, durante toda a epidemia do Covid-19 se estimulou o uso do álcool para fazer a assepsia, mas se esqueceu de orientar a população sobre os riscos do álcool e não ofereceu outros produtos que poderiam ser utilizados com a mesma eficácia para fazer a prevenção da doença.

De acordo com o médico, há cerca de nove anos, quando foi proibida a venda do álcool líquido no país, houve uma diminuição de cerca de 30% da incidência geral de queimaduras no período, mostrando que o álcool é um importante agente etiológico que causa queimaduras. “A gente está numa luta constante para diminuir a incidência de queimaduras por álcool no Brasil. Aqui é o único país do mundo que tem essa estatística alta de queimaduras pelo produto. O álcool é utilizado culturalmente como produto de limpeza de fácil acesso e barato. As pessoas usam indiscriminadamente, ser ter noção da gravidade”, reforça.

A mortalidade por queimadura em grande extensão chega de 5% a 8%. Quando não leva ao óbito, a pessoa padece de uma doença crônica. A pele queimada não protege do sol eficientemente, precisa ser hidratada constantemente, pode ter câncer, se o paciente tiver queimaduras graves e ficar internado tem grandes chances de ficar com doenças na parte imunológica, cardíaca ou neurológica por muitos anos. Além de ficar com limitações funcionais e de autoimagem que podem afetar o paciente emocionalmente e psiquiatricamente.

QUEIMADURAS - Neste período de pandemia, houve uma modificação do acidente. “Devido aos alertas da importância dada ao álcool como agente higienizador, as pessoas passaram a usar de maneira diferente de como usavam antes. Ao invés de só passar nas mãos, elas começaram a utilizar no corpo para se proteger. Ou seja, perto de uma chama, um isqueiro ou um cigarro, a pessoa pode se incendiar”, explica o presidente da SBQ, José Adorno.

A indústria ampliou o leque de ofertas dos produtos com outras variações: em spray, hidratante, perfumados e glicerinado. “Quanto tempo permanece na pele em relação ao álcool que não tem produtos adicionados? Não temos estudos ainda sobre quais cuidado a mais devemos ter”, destaca o médico.

PREVENÇÃO – José Adorno lembra que a luta contra a presença do álcool no ambiente doméstico é longa. O especialista explica que o levantamento identifica uma relação de causa e efeito, com a disponibilidade do álcool as pessoas estão tendo mais acidentes com o produto, logo ações de prevenção devem ser tomadas.

Para Adorno, “retirar o álcool do ambiente doméstico, exigir que as embalagens sejam mais seguras e identificadas como agente perigoso. Adotar medidas de normatização e leis que limitam o acesso ao produto. Além de criar campanhas educativas com a população ensinando e alertando sobre o perigo de lidar com a substância altamente inflamável que causa acidentes graves, especialmente em crianças e idosos que são pessoas mais vulneráveis a esse tipo de acidente”.